domingo, 9 de janeiro de 2011

OS CAMELOS TAMBÉM CHORAM- musicoterapia na Mongólia...

Chegam, por vezes, e-mails tão lindos que não posso deixar de os copiar, embora não sendo a autora, como meio de os divulgar e arquivar.
É o caso do seguinte:
Eu tinha lido que, lá na Índia, elefantes olhando o crepúsculo, às vezes, choram.

SABEMOS (?) que porcos e cabritos quando estão sendo mortos soltam gemidos e berros dilacerantes.
Este filme feito sobre uma comunidade de pastores de ovelhas e camelos, lá na Mongólia, mostra que os camelos choram, mas choram não diante da morte, mas em certa circunstância que faria chorar qualquer ser humano.

Para nós, tão afastados da natureza, olhando a dureza do asfalto e a indiferença dos muros e vitrinas; para nós que perdemos o diálogo com plantas e animais, e, por consequência, conosco mesmos, testemunhar com aquela  família de mongóis o nascimento de um filhote de camelo e sua relação com a mãe é uma forma de reencontrar a nossa própria e destroçada humanidade.

É isto: eles vivem num deserto.
Terra árida, pedregosa.

Eles, dentro daquelas casas redondas de lona e madeira, que podem ser
montadas e desmontadas.

Lá fora um vento permanente ou o assombro do silêncio e da escuridão.

E as ovelhas e carneiros ali em torno, pontuando a paisagem e sendo a
fonte de vida dos humanos.

Sucede, então, que a rotina é quebrada com o parto difícil de um camelinho.
Por isto, a mãe camela  rejeita-o.
O filho ali, branquinho, mal se sustentando sobre as pernas, querendo mamar e ela fugindo, dando patadas e indo acariciar outro filhote, enquanto o rejeitado geme e segue inutilmente a mãe na seca paisagem.
A família mongol e vizinhos tentam forçar a mãe camela a alimentar o filho. Em vão.

Só há uma solução, diz alguém da família, mandar chamar o músico.
Ao ouvir isto estremeci como se me preparasse para testemunhar um milagre.
E o milagre começou musicalmente a acontecer.

Dois meninos montam agilmente seus camelos e vão a uma vila próxima chamar o músico.

É uma vila pobre, mas já com coisas da modernidade, motos, televisão, e,
na escola de música, dentro daquele deserto, jovens tocam instrumentos e dançam, como se a arte brotasse lindamente das pedras.

O professor de música, como se fosse um médico de aldeia chamado para uma emergência, viaja com seu instrumento de arco e cordas para tentar
resolver a questão da rejeição materna.

Chega. E ali no descampado, primeiro coloca o instrumento com uma bela fita azul sobre o dorso da mãe camela. A família mongol assiste à cena.

Um vento suave começa a tanger as cordas do instrumento.
A natureza por si mesma harpeja sua harmônica sabedoria.
A camela percebe.
Todos os camelos percebem uma música reordenando suavemente os sentidos.
Erguem a cabeça, aguçam os ouvidos, e esperam.

A seguir, o músico retoma seu instrumento e começa a tocá-lo, enquanto a dona da camela afaga o animal e canta.

E enquanto cordas e voz soam, a mãe camela começa a acolher o filhote, empurrando-o docemente para suas tetas.

E o filhote antes rejeitado e infeliz, vem e mama, mama, mama desesperadamente feliz.

E enquanto ele mama e a música continua, a câmara mostra em primeiro plano que lágrimas desbordam umas após outras dos olhos da mãe camela, dando sinais de que a natureza se reencontrou a si mesma, a rejeição foi
superada, o afeto reuniu num  todo amoroso os apartados elementos.

Nós, humanos, na plateia, olhamos aquilo estarrecidos. Maravilhados.

Os mongóis na cena constatam apenas mais um exercício de sua milenar sabedoria.

E nós que perdemos o contato com o micro e o macrocosmos ficamos bestificados com nossa ignorância de coisas tão simples e essenciais.
 Bem que os antigos falavam da terapia musical. Casos de instrumentos que abrandavam a fúria, curavam a surdez, a hipocondria e saravam até a mania de perseguição.

Bem que o pensamento místico hindu dizia que a vida se consubstancia no universo com o primeiro som audível - um ré bemol - e que a palavra só
surgiria mais tarde.

Bem que os pitagóricos, na Grécia, sustentavam que o universo era uma partitura musical, que o intervalo musical entre a Terra e a Lua era de
um tom  e que o cosmos era regido pela harmonia das esferas.
Os primitivos na Mongólia sabem disto.
Os camelos também. Mas nós, os pós-modernos cultivamos a rejeição, a ruptura, a arrogância e o ruído.

Haja professores de música para consertar isto.

Camelos também choram




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